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_transformação digital eficiente

O Mosaico revelou a necessidade de uma atuação com base em dados e tecnologia, para que o uso da atribuição criminal – por qualquer órgão do MP – seja mais efetivo. Além disso, também demonstrou que o MPRJ precisa aprimorar a gestão do conhecimento sobre melhores técnicas de investigação em cada tema. Ou seja, não há como avançar sem, em algum momento, se deparar com um desafio de transformação digital.

O problema é que as soluções digitais para desafios do setor público têm focado em dois tipos predominantes de solução:

painéis gerenciais de visualização (dashboards)

sistemas de exploração e cruzamento de dados (georreferenciados ou não)

Em ambas, a lógica é enciclopédica e exploratória, e não de priorização e automação de providências.

A experiência do Inova_MPRJ revelou algumas limitações nessas apostas. Em muitos casos, essas ferramentas não possuem uma preocupação com documentação, sustentabilidade, custo, atualização, confiabilidade e, por vezes, segurança dos dados.

Outra a limitação parece ser o descompasso da solução com a necessidade de seu principal usuário. Essa simples indagação, sobre quem é o usuário e qual é sua realidade e necessidade de uso, fica esquecida em muitos dos novos produtos digitais.

O resultado pode ser a baixa adesão dos agentes às ferramentas e o consequente desperdício de horas de trabalho e recursos financeiros empregados em construí-las. Uma possível solução alternativa pode ser o investimento em mais alertas e automação de providências, e menos painel de controle de avião.

Para enfrentar esses dilemas, o Laboratório tentou uma nova abordagem no projeto Bússola, utilizando a ideia de “design primeiro” (design first) e economia de cliques. Mas, apesar de fugir da lógica de cruzamento de grandes bancos de dados, por meio da utilização de indicadores, ainda assim o protótipo ainda foi desenhado com o intuito de coletar bancos inteiros das unidades de serviço público fiscalizadas pelo MPRJ.

O custo para criar acesso e entender cada banco de dados, com milhares de tabelas nem sempre bem documentadas, não permitia a escalabilidade da tática. Outro fator de dificuldade foi a falta de mãos para desenvolver o protótipo desenhado. Com estes entraves, o Inova_MPRJ compreendeu que estava no caminho certo, mas que precisava de outra aposta.

Agora, com o Mosaico, usando as lições aprendidas, o time está investindo alto em inteligência de dados, com alertas e automação. Porém, em vez de um exercício de ideação e ranqueamento de dezenas de indicadores sobre um problema amplo, o Inova_MPRJ adotou uma nova abordagem baseada no conceito de racionalidade cercada (bounded rationality), criado por Herbert Simon.

Com a racionalidade cercada e uma lógica de priorização (alto impacto da informação versus baixo custo de produção/obtenção), a ideia é focar a priorização de indicadores em um recorte de problemas menores, definido com a contribuição e percepção de especialistas.

Em seguida, é hora de definir um indicador prioritário e, só então, avançar para encontrar e garantir acesso aos dados externos necessários para construir os alertas e automações respectivos.

_caso de sucesso

A promotoria parceira do projeto – 2ª PJTC de Santo Antônio de Pádua – participou de um experimento, testando a proposta imaginada como produto do Mosaico.

Tratava-se de notícia de despejo irregular de resíduos sólidos em propriedade rural. De acordo com o sistema vigente no MPRJ, a atribuição para a defesa ambiental da 2ª PJTC seria restrita aos instrumentos de atuação cível (inquérito civil, compromisso de ajustamento de conduta e ação civil pública). Seguindo esse caminho, a expectativa de conclusão do caso seria a média de 3,8 anos, como demonstrado no levamento realizado pelo Projeto Mosaico:

De forma experimental e concorrente à promotoria criminal, a PJTC parceira fez uso da atribuição criminal, instaurando um PIC. Por conta disso, a PJTC pôde fazer uso da transação penal como instrumento para a apresentação de proposta de cessação do dano e recuperação da área. Com um incentivo maior (responsabilização criminal) do que a proposta de um TAC, o resultado foi de desfecho satisfatório, com a assinatura do acordo em tempo recorde.

A mesma tática pode ser usada em casos de danos ao patrimônio público, com o ANPP.

_desafio nacional

Os primeiros resultados do Mosaico só foram possíveis com a participação dos parceiros internos. Por meio de entrevistas, um formulário e um grupo focal com promotores e procuradores, a equipe do projeto confirmou a hipótese inicial e descobriu desafios paralelos – que foram inseridos no escopo do Mosaico.

Desde o início, já se imaginava que os desafios levantados pelo projeto poderiam também existir em outras unidades do MP. Essa percepção se confirmou com a parceria firmada com os coordenadores de CAO de Patrimônio Público do MP nacional, reunidos no Grupo Nacional de Defesa do Patrimônio Público (GNPP).

Já existem promotorias de justiça com atribuição híbrida (cível e criminal) em algumas unidades do MP. Mas, ainda assim, o GNPP concordou com a necessidade de aprimoramentos na tática de (e desenho de atribuições para o) uso de instrumentos de persecução penal para a investigação e repressão de atos de improbidade administrativa que configurem crime – ainda mais após o recentemente esvaziamento normativo da Lei 8.429/2021.

Além disso, o GNPP também viu valor na possibilidade de solução aos desafios paralelos revelados pelo Mosaico. Em especial, a necessidade de definição de critérios de priorização da atuação e o desenvolvimento de tática (e ferramentas) para a melhor gestão do conhecimento investigatório.

Por fim, a parceria trouxe frutos para o projeto, permitindo uma comparação detalhada entre os sistemas atualmente existentes em alguns MPs (que contribuíram para a pesquisa), no que dizem respeito ao uso combinado das atribuições cível e criminal.

Veja aqui uma tabela comparativa das resoluções.

_mudança de cultura

No início do experimento, alguns promotores convidados demonstraram receio à proposta da priorização e redução do acervo de investigações. A razão é compreensível.

Em primeiro lugar, há uma regra da Corregedoria do MPRJ impondo que toda investigação instaurada seja impulsionada, não podendo parar por mais de 40 (quarenta) dias.

Em segundo, a recusa de instauração de uma nova investigação depende da concordância do Conselho Superior do Ministério Público. Tradicionalmente, o Conselho tem dado mais primazia à obrigatoriedade do que à eficiência – exigindo atuação em casos de pequena expressão (risco ou dano).

A Secretaria-Geral e a Coordenadoria de Movimentação do MPRJ utilizam o quantitativo de investigações em andamento em cada PJTC para decisões de Recursos Humanos. Assim, a PJTC que reduzir seu acervo, abaixo da média de inquéritos civis em andamento, corre o risco de perder funcionários e não receber auxílio, quando necessário.

Por fim, a própria SUBPPI também se vale, de forma absoluta, do quantitativo de inquéritos em andamento em uma PJTC para decidir sobre desmembramento ou fusão de PJTC. Ou seja, caso a PJTC reduza o seu acervo, priorizando seu foco, a consequência pode ser a fusão de atribuições de outra PJTC, resultando em mais trabalho.

Apenas quando em contato com as primeiras PJTC candidatas ao experimento, a equipe do Mosaico teve real dimensão do peso desses incentivos contrários à atuação prioritária e estratégica, com redução do acervo das PJTC.

Por isso, em paralelo ao desenvolvimento dos critérios de priorização e agrupamento temático nas PJTC voluntárias, a equipe do Mosaico precisará buscar a sensibilização dos demais atores institucionais da Administração do MPRJ.

No mínimo, poderá ser necessário o uso de um sandbox (como previsto na regulamentação do Inova_MPRJ), para suspender a aplicação das regras que criam os incentivos desalinhados ao experimento às PJTC participantes. Ou, então, simular uma Promotoria com um acervo reduzido e, em casos prioritários, testar o uso de novas táticas (com a combinação de atribuições).

_pareto reverso

Para compreender os resultados da pesquisa realizada, em comparação com os desafios mapeados, a equipe do Mosaico fez primeiro uma análise referente à eficiência dos instrumentos utilizados pelas PJTC. A primeira abordagem seguiu o conceito de efetividade indicado pelo economista italiano Vilfredo Pareto.

A lógica de Pareto é baseada em uma regra que indica que 80% dos resultados tendem a decorrer de apenas 20% das causas ou ações. Utilizando esse princípio é possível otimizar a produtividade de organizações compreendendo quais são as causas que compõem os 20% e priorizando esforços sobre elas.

Buscando entender a atuação do MPRJ de acordo com a lógica de Pareto, a equipe do Mosaico analisou os dados referentes ao uso dos instrumentos e táticas de atuação na área criminal e cível. Em especial, quanto à repressão de ilícitos contra a Administração Pública pela ação de improbidade administrativa (instrumento cível) e ação penal (instrumento criminal).

Esses resultados indicam que o MPRJ acaba focando mais sua atuação no instrumento considerado menos efetivo, sem que haja um critério institucional de priorização. Ou seja, é bem provável que se tenha algo como um pareto reverso.

A proposta inicial do Mosaico é explorar modos de se inverter este quadro. Ao priorizar sua atuação em causas mais importantes e para elas utilizar os instrumentos e táticas mais efetivos, o MPRJ terá mais resultados e melhor qualidade de atuação.

_priorização

A pesquisa preliminar com promotores das PJTC foi essencial para compreender a existência de outros desafios paralelos das promotorias. Nas entrevistas, no questionário e no grupo focal, a maioria dos participantes enfatizaram a necessidade de:

1.redução e digitalização do acervo de investigações simultâneas da promotoria;

2.melhor medição dos dados (tanto já disponíveis, quanto pós processo de digitalização);

3.critérios de priorização.

Segundo os promotores, um dos fatores que impossibilita as promotorias de atuarem de forma efetiva é o alto número de inquéritos e ações em andamento.

Por isso, um novo método de priorização é essencial para a redução do acervo, assim criando condições para o desenvolvimento e uso de melhores táticas.

A ideia é reorientar as PJTC para atuação conforme a lógica de Pareto e, nos casos mais estratégicos de cunho repressivo, permitir o uso dos instrumentos mais efetivos – sem aumentar o volume de trabalho.

O processo de criar critérios de priorização não será fácil, já que:

1

atualmente não há qualquer critério institucional de prioridades

2

há incentivos desalinhados para a redução do acervo e a dedicação de foco exclusivo a poucas investigações

3

os critérios irão variar conforme cada tema de atuação

A experiência de instituições líderes em controle externo, como o Tribunal de Contas da União, mostra que a tarefa não é impossível. O TCU usa, por exemplo, critérios objetivos para selecionar temas estratégicos de atuação e possibilita a cada auditor a dedicação focada de tempo às auditorias prioritárias, até sua satisfatória conclusão.

Dados preliminares levantados pela pesquisa mostram que enquanto em um mês um auditor do TCU pode dedicar cerca de 140 horas mensais para uma mesma auditoria, no MPRJ uma PJTC não consegue dedicar mais do que 30 minutos por investigação, por mês*.

*última média levantada foi de 223 inquéritos civis por mês por PJTC
*última média levantada foi de 223 inquéritos civis por mês por PJTC

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