Renan de Souza Filho

Renan de Souza Filho
Renan tinha apenas 6 anos quando sofreu os impactos da violência estatal. Morador da comunidade de Acari, passava a infância em brincadeiras simples com seu irmão Maicon, como jogos com garrafas e tampinhas. Carrega poucas, mas boas lembranças de seu irmão, especialmente da piscina de plástico que sua mãe havia comprado e que ambos utilizavam em suas brincadeiras.
A perda precoce do irmão marcou sua infância e sua forma de ser criado. A mãe, tomada pelo luto e pelo medo, passou a superprotegê-lo, restringindo seus movimentos, mantendo-o em escolas próximas e evitando sua participação em festas e eventos comunitários. O pai, por sua vez, assumiu a luta por justiça como projeto de vida, dedicando tempo e energia à busca por responsabilização, o que custou grande parte da convivência familiar.
Hoje, Renan vive em Portugal, para onde se mudou em 2015, em busca de segurança e estabilidade emocional, após episódios de violência policial e invasão de sua casa. Superando as dificuldades da imigração, conseguiu se legalizar, construiu uma nova vida com esposa e filhos, e, atualmente, trabalha como motorista de caminhão, amparado pelos mesmos direitos dos cidadãos portugueses. Ainda assim, carrega lembranças dolorosas de sua infância e afirma não conseguir voltar à comunidade de Acari, que lhe traz memórias de sangue, dor e perda.
O crime
Em 15 de abril de 1996, Maicon, irmão mais novo de Renan, foi morto aos dois anos de idade durante uma operação policial em Acari. Os meninos brincavam em um beco quando foram surpreendidos por disparos de policiais militares do 9º Batalhão. Maicon foi atingido fatalmente e Renan recorda a cena da mãe ensanguentada e, em seguida, o velório, marcado pela imagem de um pequeno caixão branco.
No dia seguinte, a cena do crime já era lavada por vizinhos, com água misturada ao sangue da criança descendo pelo beco. Essa lembrança se tornou indelével para Renan, cristalizando a brutalidade da perda. O crime interrompeu não apenas a vida de Maicon, mas também a infância de Renan, que passou a crescer sob a sombra da tragédia e do medo.
As consequências do crime - o que fica
O assassinato de Maicon deixou marcas profundas. Renan cresceu superprotegido, com a mãe vivendo entre a dor, a depressão e, hoje, sintomas de Alzheimer. Já seu pai transformou a luta por justiça em uma missão pessoal. A família foi desfeita pelo luto e pela violência, e Renan, já adulto, buscou refúgio fora do Brasil para proteger seus próprios filhos.
Hoje, apesar de ter construído uma vida segura em Portugal, Renan ainda sofre os efeitos da violência vivida na infância: medo, ansiedade e a ausência de lembranças felizes ao lado do irmão. Ele lamenta que sua convivência com Maicon tenha sido tão curta e reduzida a poucas memórias de brincadeiras.
Mesmo à distância, Renan carrega a herança da violência estatal que vitimou sua família. Sua história representa a dor da infância roubada, o impacto psicológico permanente da violência e a necessidade de justiça e reparação para que outras famílias não sofram com a mesma perda.