O Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro (MPRJ), por meio da 3ª Promotoria de Justiça de Tutela Coletiva da Saúde da Capital, expediu, na sexta-feira (30/05), uma requisição de informações à Secretaria Municipal de Saúde do Rio de Janeiro (SMS-Rio) para esclarecer contradições entre os avanços anunciados pelo município na rede oftalmológica do SUS e evidências que apontam a persistência de problemas críticos no atendimento. Entre os principais pontos de preocupação estão filas de espera prolongadas, que podem representar risco de perda visual irreversível para diversos pacientes. A SMS-Rio terá prazos escalonados de até 90 dias para apresentar as informações solicitadas.

O MPRJ reconhece os investimentos realizados pela Prefeitura do Rio de Janeiro nos últimos anos, incluindo a inauguração do Centro Carioca do Olho (CCO), em 2023, a modernização tecnológica e o aumento reportado de mais de 900 mil vagas no Sistema de Regulação (SISREG) entre 2022 e 2023. O próprio Portal da Transparência do SISREG indica reduções significativas nos tempos de espera para procedimentos como a cirurgia de catarata, cuja média caiu de 230 para 68 dias. A gestão municipal também informou, em 2023, ter “zerado” a fila para consultas de glaucoma.

Contudo, apurações conduzidas pelo MPRJ identificaram contradições que necessitam de esclarecimentos. A análise de dados do SISREG, aliada a denúncias de usuários, revelou que, apesar dos investimentos, algumas especialidades oftalmológicas registraram agravamento expressivo nas filas de espera entre o fim de 2023 e 2024. Nesse período, observou-se aumento de 776% na fila para exames de glaucoma, 675% nas consultas em oftalmologia pediátrica e 479% nas consultas na subespecialidade de córnea. Destaca-se, especialmente, a situação do glaucoma: embora o município tenha declarado ter solucionado a fila em 2023, dados de outubro de 2024 apontam 9.575 pacientes aguardando consulta, com tempo médio de espera de 231 dias.

A investigação do MPRJ também incluiu a análise de 13 denúncias recebidas entre 2024 e 2025. Em 46,15% desses casos, foi identificado risco de perda visual irreversível, demonstrando que os problemas permanecem e afetam diretamente a saúde da população. As evidências apontam ainda falhas de comunicação institucional e ausência de transparência, o que compromete a confiança no sistema e a efetividade da política pública de saúde ocular.

Na requisição, o MPRJ estabeleceu prazos escalonados para o envio das informações. Em até 30 dias, a SMS-Rio deverá apresentar dados que confirmem os achados mais críticos, instrumentos de planejamento obrigatórios e justificativas técnicas. No prazo de 60 dias, deverá encaminhar a base de dados completa do SISREG em formato CSV, análise da capacidade instalada frente à demanda, contratos vigentes e informações sobre a execução orçamentária da área de oftalmologia. Por fim, em até 90 dias, a Secretaria deverá fornecer os códigos utilizados para a geração de indicadores, estudos técnicos e dados sobre os sistemas de monitoramento e transparência.

Uso de inteligência artificial na análise de dados
A apuração contou com o apoio do Laboratório de Inovação (Inova_MPRJ), que utilizou ferramentas de inteligência artificial para análise de inquéritos civis e denúncias relacionadas à oftalmologia no município. A iniciativa integra projeto experimental do MPRJ que busca aplicar a IA em todas as etapas da atuação das promotorias de Justiça, com o objetivo de identificar padrões críticos com maior precisão e monitorar a efetividade das políticas públicas.

O MPRJ acompanhará o cumprimento dos prazos estabelecidos e analisará os documentos enviados pela SMS-Rio para avaliar a necessidade de adoção de medidas judiciais voltadas à correção dos problemas e à garantia do direito à saúde visual da população fluminense.

Por MPRJ