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Experiências de atuação da Pedagogia, da Psicologia e do Serviço Social
            na defesa dos direitos humanos de crianças e adolescentes


                   Sobre a perspectiva mercadológica, na pesquisa realizada pelo CEDECA Yves de Roussan,
            os autores do trabalho, explicam que:




                                   [...] há pistas de que o interesse prioritário dos clubes é identificar talentos, lapidar
                                   e preparar futuros jogadores de futebol. Sob esse prisma, a manutenção das
                                   categorias de base e as constantes convocatórias para testes, assim como as fases de
                                   treinamento das categorias de base, integram a modalidade desporto de rendimento
                                   – o que as vincula diretamente às relações de trabalho e exclui as modalidades de
                                   desporto educacional ou de participação. Há muitos questionamentos a favor ou
                                   contra o sistema adotado por escolinhas e centros de treinamento. Todos passíveis
                                   de discussão, exceto um: quando tratamos de crianças, o esporte educacional é o
                                   único adequado e permitido por lei (CEDECA Yves de Roussan, 2013, p. 22)




                   A ênfase do CEDECA Yves de Roussan sobre a função educacional do esporte, é uma crítica
            relacionada  aos  obstáculos  historicamente  construídos  pelas  exigências  cada  vez  maiores  da
            performance dos jogadores, em detrimento do viés pedagógico do esporte.  Ao considerarmos o
            trabalho precário na direção da manutenção dos vínculos familiares e comunitários, evidencia-se
            também um distanciamento do entendimento da função protetiva da família, em detrimento do
            vínculo trabalhista e/ou de aprendiz em função da busca de um sonho.

                   A inserção de crianças e adolescentes em rotinas esportivas dos clubes e escolinhas de futebol
            repercutem muitas vezes dos desejos manifestos por elas próprias, como também de seus familiares
            e responsáveis. Neste cenário, considerando a amplitude nacional do esporte em questão, estas
            situações se materializam em todos os estados da federação, ainda que nem todos estes estados
            se constituam enquanto centros de repercussão da modalidade esportiva e da mesma forma com
            iguais condições de estrutura para o desenvolvimento adequado de atletas de alto rendimento.

                   Dessa forma, aspectos inerentes a garantia do direito à convivência familiar e comunitária
            tornam-se fragilizados diante da necessidade de deslocamento da criança e/ou adolescente de
            seu bairro ou cidade/estado para os grandes centros de desenvolvimento do futebol, onde estão
            sediados os grandes clubes. Esse deslocamento muitas vezes acontece sem o acompanhamento de
            seus responsáveis legais para locais aonde permanecem por longos períodos sem oportunidades
            frequentes  de  visitação  e  supervisão,  muitas  vezes  assistidos  por  terceiros,  pessoas  que  se
            constituem enquanto representantes das famílias ou empresários sem vínculo anterior com a
            criança/adolescente e até mesmo com a família.


                   Soma-se a este contexto de violações de direitos, a análise do Melo (2010) que aponta
            que os atletas emigrantes, que vivem em regime de albergamento nos clubes do Rio de
            Janeiro, possuem maior número de reprovações e atraso escolar do que os atletas que residem
            com  suas  famílias.  Na  mesma  direção  Melo,  Soares  e  Rocha(2014),    explicam  que  apesar  da
            observância as leis nacionais que dispõe sobre a obrigatoriedade dos adolescentes estarem
            regularmente matriculados em uma instituição de ensino, “há uma fragilidade na negociação
            entre a escola e o clube, uma vez que a escola se coloca na condição de facilitadora para que o
            atleta continue investindo na sua formação no clube” (MELO, SOARES E ROCHA, 2014).

                   Nas  incursões  ministeriais  foi  possível  observar  ainda  sobre  a  supervisão  desses
            adolescentes,  a  isenção  dos  dirigentes  quanto  as  possíveis  ocorrências  de  pernoite  dos
            adolescentes  fora  do  alojamento,  o  que  tem  como  consequência  a  responsabilização  do
            próprio adolescente por eventuais condições de vulnerabilidade, risco social e violação de


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